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Mulheres e trabalho: pesquisa aponta violência e sobrecarga como maiores entraves das brasileiras

Chegou 2020 e nem deu tempo de comemorar. No meio do caminho tinha uma pandemia. E, apenas nos primeiros quatro meses após a chegada da Covid-19, 5 das 8 milhões de pessoas que ficaram desempregadas foram mulheres. São elas também as principais responsáveis pelas mais de 113 milhões de crianças que estão em casa desde março, sem perspectivas de voltar a creches e escolas. Na contramão das muitas empresas e negócios que já estudam – ou já iniciaram – o retorno às atividades presenciais de seus colaboradores. Sem muita ou nenhuma atenção a políticas focalizadas para assegurar que mães não percam seus empregos por não terem com quem deixar os filhos ou não conseguirem equilibrar as demandas profissionais com as necessidades da rotina familiar.

Num contexto com tantos contornos assustadores, quais as consequências mais temidas pelas mulheres em suas carreiras e que desafios pessoais foram acentuados pela nova circunstância? Essas e outras perguntas fizeram parte da primeira pesquisa sobre mulheres e mercado de trabalho após a primeira onda da pandemia, realizada por Marie Claire Salesforce, multinacional de soluções para CRM, atendimento e marketing. Em “Mulheres e trabalho: dilemas das brasileiras dentro e fora das empresas”, cerca de 3 mil leitoras, de 17 a 65 anos, ajudaram a encontrar algumas respostas e, também, indícios de quais ações se fazem urgentes e necessárias para frear o retrocesso.

Maioria da população no Brasil, mulheres vivem mais tempo e estudam mais, além de ocupar 44% das vagas de empregos registrados no país. No entanto, ainda que sejam 55% das universitárias e 53% do total de alunos de pós-graduação, elas ganham 20% menos que os homens em funções iguais e ocupam somente 13% dos cargos de alta liderança. Os dados vêm de fontes oficiais, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Censo Educacional.

Não à toa, segundo a pesquisa de Marie Claire Salesforce, uma das três maiores preocupações delas atualmente é a diferença salarial, apontada por 42% das respondentes. Esse, no entanto, não é o maior problema que enfrentam hoje. Em primeiro lugar, está a violência doméstica (62%), tema que parece distante dos ambientes corporativos, mas que assombra muitas mulheres dentro e fora deles.

Outro grande desafio é lidar com a sobrecarga de papéis (52%) e, muito provavelmente em decorrência dela, com estresse e depressão (49%). O que explica por que, para 46% dessas mulheres, o que impede o próximo passo na carreira é a dificuldade de conciliar vida pessoal e profissional. Mais de 60% sentem enorme pressão em alcançar a perfeição na carreira e na vida familiar, 53% gostariam de compartilhar a carga parental de forma mais igualitária com seus parceiros, e 48% acreditam ter obrigação de cumprir dupla ou tripla jornada para dar conta.

Lidar com questões de sempre como essas, renovadas agora pelos efeitos da crise pandêmica, “demanda um olhar holístico das empresas, que as faça pensar em políticas internas que valorizem todas as pessoas em suas diversidades”, afirma Priscila Castanho, diretora de Employee Success da Salesforce para a América Latina. “Na Salesforce, com relação especificamente às mulheres e seus dilemas, temos investido em capacitação de liderança e mentorias. E, respeitadas as legislações de cada país, implantamos uma cultura forte de atenção à família, que inclui estímulo à maternidade, paternidade e adoção, inclusive para casais homoafetivos”, conta a executiva. “É um papel da companhia fazer esse exercício constante de minimizar o abismo.”

Aproximadamente 80% das respondentes afirmam apoiar mulheres em seus locais de trabalho. Por outro lado, somente 39% dizem dar preferência ao trabalho de outras mulheres quando precisam adquirir um produto ou serviço. Há ainda uma visão paradoxal também em relação à igualdade de oportunidades, comparando as respostas de mulheres brancas e mulheres negras. Enquanto para 76% das negras todas as mulheres encontram menos oportunidades, para 40% das brancas a falta de oportunidades é geral, não importando raça, gênero ou orientação sexual.

Ao serem questionadas sobre suas prioridades, a maioria das mulheres negras (60%) gostaria de ser mais bem remunerada e 59% delas percebem no preconceito o principal adversário na luta pela ascensão profissional. Já para a maior parte das mulheres brancas (56%), a meta principal é encontrar equilíbrio de jornadas e, para 42% delas, um dos fatores que mais impactam o crescimento profissional é o medo de não dar conta.

Para Nina Silva, CEO do Movimento Black Money, não há surpresa nessas constatações. “O recorte racial de fato traz questões e dilemas completamente diferentes para a luta de gênero”, explica. “E a maior parte das empresas ainda institui políticas de inclusão de mulheres sem considerar raça. Não raro, áreas de diversidade são lideradas por pessoas brancas que, mesmo bem-intencionadas, acabam se pautando pelas estruturas familiares que conhecem, de acordo com a realidade das mulheres que têm por perto.”

Assédio, inimigo comum a todas
Está na lei. Conforme o artigo 216-A do Código Penal, constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função é passível de pena de detenção de um a dois anos. Ainda assim, 36% das mulheres que participaram da pesquisa de Marie Claire e Salesforce disseram já ter sido vítimas ou ter testemunhado (43%) uma situação de assédio sexual.

Outras 67% já foram vítimas de assédio moral ou viram outros colegas serem submetidos a esse tipo de abuso por parte de superiores (72%). E embora 60% das respondentes considerem se sentir mais à vontade para falar sobre o assunto hoje do que há cinco anos, a maioria dessas mulheres não confia nos canais de denúncia das empresas ou em áreas e pessoas que poderiam ser consideradas aliadas. Entre as razões da insegurança, 35% têm certeza de que o agressor sairá impune e que a situação será vista com naturalidade, e outras 33% temem retaliação.

“Acredito que este é um dos recados mais importantes desta pesquisa. Episódios de assédio moral e sexual são recorrentes nas empresas e é preciso repensar as formas de apoio e encorajamento às vítimas”, diz Laura Ancona, diretora de Marie Claire. “Assistimos a um avanço público contra a impunidade, com movimentos como o #MeToo, mas é uma questão delicada. E, mesmo quando apresentados de forma sutil, esses são atos de extrema violência que podem abalar toda uma trajetória profissional.”

Quando o assunto são os públicos minorizados dentro de corporações, que além de negros incluem profissionais LGBTQIA+ e pessoas com deficiências (PcDs), a jornada por diversidade parece estar em estágio ainda muito inicial. Ao menos 70% das respondentes já presenciou piadas sobre LGBTQIA+ no ambiente de trabalho. Muitas vezes, na presença de funcionários desse grupo. Para 43%, há também muito preconceito, mesmo que velado. As PcDs são tratadas com mais respeito, porém raramente chegam a cargos de liderança ou gestão (7%).

Cristina Kerr, CEO da CKZ Diversidade, consultoria de liderança e cultura inclusiva, aponta que essa característica permissiva para piadas ou o famoso bullying é algo inerente ao mercado de trabalho brasileiro. Ela ressalta a importância de entender a inclusão como senso de pertencimento. “E, para que a pessoa se sinta pertencida e valorizada, as piadas sobre sua sexualidade, raça ou gênero não devem ter espaço”, explica. Assim como Nina Silva, Cristina chama atenção ainda para a necessidade de considerar a interseccionalidade em qualquer debate sobre diversidade. “Sobretudo em perfis que, de certa forma, acumulam as ‘caixinhas’ de minorias.”

Embora a maioria das corporações aborde questões de gênero, inclusão e diversidade de alguma maneira, faltam medidas afirmativas e de maior efetividade.

De acordo com a pesquisa de Marie Claire Salesforce, somente 5% das mulheres disseram trabalhar em empresas com políticas específicas de acolhimento ou que promovem ações educativas (4%).

Para Luana Gimenez, assistente-executiva na Salesforce, esse é um forte ponto de atenção para todo o mercado. “A coexistência na diversidade é necessária para formar aliados na busca por justiça social e inclusão. Na Salesforce, essa jornada já está em curso, ao fortalecer nossa comunidade para que sejamos agentes transformadores da sociedade. Mas esse é um trabalho de todos e que pede, como já ocorre aqui, envolvimento e apoio das lideranças executivas”, finaliza.

Fonte: Marie Claire

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